Especialistas questionam a adequação de um recente comunicado do governo dos Estados Unidos, que ofereceu apoio à Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro. Apesar de os EUA terem um histórico de interações com níveis subnacionais de governos estrangeiros, a oferta foi considerada por alguns como um procedimento inadequado.
O cientista político, jornalista e professor de relações internacionais Bruno Lima Rocha recorda um caso similar no Brasil, envolvendo a operação Lava Jato, onde houve cooperação direta entre autoridades brasileiras e o FBI, sob o pretexto de combate ao terrorismo e lavagem de dinheiro.
Raphael Lana Seabra, professor da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em história latino-americana, classificou a oferta de ajuda como “incomum e inadequada”, levantando questões sobre soberania. A carta, assinada por um representante da Divisão Antidrogas dos EUA, expressava condolências pela morte de policiais em uma operação nos complexos do Alemão e da Penha e se oferecia para prestar “qualquer apoio que se faça necessário”. Seabra argumenta que os EUA também enfrentam problemas com drogas e crime organizado, e ninguém oferece ajuda similar quando eventos trágicos ocorrem em solo americano.
Bruno Lima Rocha compara a ação do governo dos EUA com as práticas da Guerra Fria, quando a cooperação policial pan-americana influenciou a estrutura da polícia militar brasileira. Ele alerta para a possibilidade de “ingerência” caso se classifique o tráfico de drogas como narcoterrorismo. Rocha observa que os EUA, assim como Israel, buscam a “paradiplomacia”, estabelecendo relações com governos subnacionais, como secretarias de Estado e prefeituras, o que poderia contornar a diplomacia formal do Itamaraty.
Ambos os especialistas criticam a proposta de classificar facções de tráfico de drogas como terroristas, argumentando que o terrorismo tem motivações doutrinárias, religiosas, ideológicas e políticas, buscando poder em vez de acumulação de riqueza. Eles alertam para os riscos dessa reclassificação, especialmente em um período pré-eleitoral.
Seabra recorda que os EUA admitem ter autorizado operações secretas na Venezuela, com o objetivo de pressionar o governo, sob o pretexto de combater o narcotráfico, demonstrando um desrespeito às leis internacionais e violando a soberania de outros países. O México também enfrenta ameaças similares, com sua presidente expressando rejeição a qualquer ação da CIA em território mexicano.
Para Seabra, a solução para o problema do crime organizado no Brasil deve ser nacional, focando na fonte dos recursos ilícitos, em vez de apenas atacar os pequenos criminosos. Rocha defende uma resposta conjunta de autoridades federais, como a Polícia Federal e o Itamaraty, para reiterar que a questão é interna.
Em resposta, o governo do Rio de Janeiro declarou que mantém constante troca de informações com instituições de combate ao narcotráfico dos EUA e de outros países, devido às ramificações internacionais do crime. A nota esclarece que a interlocução não implica permissão para ações do governo americano em solo brasileiro, o que não é permitido pela legislação.
Fonte: agenciabrasil.ebc.com.br
